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Probacionista

Sobre Thelema

 

Faze o que tu queres há de ser tudo da Lei.

 
Algumas discussões andam sendo ensejadas com o objetivo de estabelecer-se, de uma vez por todas, o que vem a ser Thelema. Vemos muitas personalidades discutindo, afrontando-se, embatendo-se, criticando-se, por vezes humilhando, não apenas – observe bem, caro leitor - com o objetivo de vencer a batalha dialética, mas principalmente destruir completamente o oponente. Chego até a ouvir os gritos daqueles que crêem, com todas as suas forças, que este é o caminho.

Aqui se tentará, não sem esforço, construir uma visão de como se alcançar um entendimento sobre Thelema, ao invés de estabelecer uma verdade imutável sobre o assunto. Ao contrário do que se pode esperar, não se pretende dogmatizar nada; aos que pretendiam uma definição, ledo engano. Mas algumas verdades serão apresentadas.

Primeiramente, observe que a maioria dos contendores têm pouca ou nenhuma “intimidade” com o material indicado para estudo daqueles que são “aspirantes à Thelema”. E, invariavelmente, essa incipiência nada tem a ver com o tempo despendido “desde que se conheceu Thelema”... Existem muitos que estão batendo suas cabeças entre libri e rituais há muito tempo, mas que nunca aprofundaram os estudos sobre aquilo que forma o arcabouço de Thelema. Sim, pois como muitos dizem e outros descobrem, boa parte do que fora sistematizado por Crowley em seus escritos já existia antes dele. Isto é um fato.

Quantos dos ditos “thelemitas” já atentou para o fato de que a Besta cita outros filósofos e cientistas, sociólogos e psicólogos, muitas vezes como adeptos, outras como santos? Para aqueles que atentaram, quantos já leram a obra dessas figuras, expoentes o suficiente para figurarem neste hall? Quantos conhecem o ceticismo de Hume, o transcendentalismo de Kant, ambos empíricos, Herbert Spencer e seu controverso darwinismo social? Willian Blake e seus poemas, Rabelais e sua Abadia de Theleme? Para a compreensão de alguns pontos a recomendação é o estudo de física matemática! Isto posto, a primeira verdade reside na quase impossibilidade, concomitantemente, de se ser inculto e possuir um razoável entendimento sobre Thelema.

Engana-se quem pensa que, a despeito de ter Crowley afirmado que “mistério é inimigo da verdade”, todo o conhecimento está escancarado e o caminho conhecido. Os arcanos continuam velados e sua apreensão continua necessitando dos mesmos processos (internos) de sempre. O fato de muito material estar escrito e aberto não garante – de maneira nenhuma – consecuções iniciáticas. É preciso, pois, estudar de forma sistemática, tendo-se em vista que os escritos thelêmicos funcionam como balizas do caminho. O profeta o percorreu e estabeleceu marcos, selecionando aquilo que realmente possuía alguma serventia. Mas em momento algum ele informou que o sucesso seria alcançado gratuitamente, ou mesmo facilmente. “Sucesso é a tua prova”.

Até aqui traçamos uma abordagem, digamos, filosófica do assunto. Mas ele não se restringe a isso. A compreensão da linha de pensamento que levou Crowley a desenvolver Thelema pode dar a conhecer seus motivos, mas não o resultado. Ainda assim é indispensável.

“Nós, portanto, devemos empregar um Sincrético-Eclético-Método, combinando o essencial de todos os sistemas, descartando todos os seus obstáculos para solucionar o Problema através de experimentos corretos e não por suposições.” (Mensagem aos probacionistas, I, 8)

Parte-se, portanto, para a linha prática, ritualística, procurando-se obter resultados a partir de experimentos mágickos – ou místicos – de consecução. Aqui, mais que em qualquer outro lugar, há que se pensar em método científico, que ocupa-se de um amplo espectro de ações positivas, onde uma falha pode invalidar um experimento místico ou uma operação mágicka.

A seqüência de práticas leva o postulante a uma mudança de paradigma, uma consecução. É esta consecução que torna diferente, que modifica o entendimento que terá dali para frente, sobre Thelema. Nessa mesma esteira estão os ordálios. A diferença é que os ordálios não dependem de ações positivas para apresentarem-se – muito ao contrário –. Mas para transpô-los...

Daí se depreender a segunda verdade que é “para cada estágio do caminho, uma consciência”. Sem comentar, cita-se Líber AL, III, 63-68. Sim, o sucesso consciente nos ordálios e caminhos (experiência) garante a mudança de consciência. É nisso que se baseia todo sistema de evolução dentro da Santa e Inominada Ordem. Assim, e não de outra forma.

Vale ressaltar que a realização esporádica de rituais, específicos e/ou de natureza incompreendida não resolvem a questão. Todos os rituais dão um resultado, sabe deus qual...

Muitos tentam obter domínio de força ou controle de poder através de práticas controversas, sem observar etapas necessárias ao desenvolvimento das suas próprias capacidades de controlar certos eventos, sem equilibrar seus elementos, e muitas outras falhas graves. Acabam sendo dominados por suas paixões e desejos recalcados. É triste, mas o que muito se vê são pessoas que se revestem do manto de “thelemitas” para projetar sobre outrem seus complexos, recalques, sentimentos de inferioridade, vileza de caráter, realmente velando vícios com palavras virtuosas.

Embora aqui não se diga o que Thelema é, podemos afirmar que não é um sistema de egocentrismo, egoísmo, truculência, intransigência... Nas palavras de Therion:

“(…)Outra vez: "Tu não tens direito senão fazer a tua vontade. Faze aquilo e nenhum outro dirá não. Pois vontade pura, desembaraçada de propósito, livre da ânsia de resultado, é toda via perfeita".

Considerai isto cuidadosamente; parece implicar uma teoria que se todo homem e toda mulher fizesse sua vontade - a verdadeira vontade - não haveria conflito. "Todo homem e toda mulher é uma estrela", e cada estrela move-se em uma órbita determinada sem interferência. Há muito espaço para todos; é apenas a desordem que cria confusão.

Destas considerações estaria claro que "Faze o que tu queres" não significa "Faze o que te agrades". É a apoteose da Liberdade; porém é também a mais estrita das injunções.” (Liber II)

A mais estrita da injunções! Sim! O leitor já pensou na responsabilidade de viver-se de acordo com tamanha liberdade? Já pensou nas implicações? A desordem cria confusão, já foi dito. Por isso, é preciso antes de qualquer coisa, ser apto para tal.

Ninguém precisa lutar por espaço; as estrelas brilham por si, cada qual em seu lugar.

Por que tantos, então, tentam apagar os outros, sobrepujando-os com suas verdades edêntulas? Por que tentam impor seus conceitos goela abaixo dos demais? Pior, por que tentam alguns sacripantas arrebanhar a massa de incautos digladiadores, senão para torná-los fiéis difusores de suas concepções “thelêmicas” extremamente dogmáticas?

Simples, os escravos servirão... E com orgulho baterão no peito: “Eu sou thelemita!”

Como foi dito noutra ocasião, todos já fizeram parte – algum dia e por algum tempo – da massa disforme e rebelde descrita acima. Alguns libertaram-se disso. Só cabe a você, caro leitor, levantar a damascena espada do guerreiro e lutar de verdade ou permanecer nessas disputazinhas patéticas de e-mails em listas e conteúdo instantâneo de sites de busca... Isto posto, o leitor atento inferirá que apenas através da concatenação das apreensões intelectual e prática, e principalmente da experiência stricto sensu, pode alguém supor-se digno representante do “ser thelemita”, nem melhor nem pior que seu semelhante, mas muito, muito diferente.

Para quem quiser começar bem, recomenda-se Líber II, “Mensagem aos probacionistas” e Líber LXXVII vel Oz.

“A Lei é para todos”.

   Amor é a lei, amor sob vontade. 

 

An IVxvi Sol 13° Gemini, Luna 6° Gemini Dies Martis

Terça-feira, 03 de junho de 2008 E.:V.:

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